“Censurar ninguém se atreverá, meu canto já nasceu livre” (Sérgio Salles-Oigers)
Dê vida de verdade à sua poesia, leve-a para passear em Centro Culturais, Escolas ou qualquer espaço onde a poesia possa realmente viver e ser livre. (Arnoldo Pimentel)
Poesia na Calçada, projeto Gambiarra Profana
Gambiarraprofana.blogspot.com
MAR E A ROSA
As ondas quebravam banhando-se na areia iluminada pela pouca claridade da lua, a praia estava deserta, entre a praia e a pequena elevação coberta de verde, um calçadão e uma estrada que hora ou outra era iluminada por faróis de algum automóvel que por ali passava, o vento levantava um pouco de poeira, que não chegava a esconder o mar, que parecia um pouco agitado naquela hora da noite, algumas palmeiras ilustravam a paisagem do calçadão, uns poucos banco e mesas de pedra para descanso ou outro passatempo que quase nunca eram usados. O automóvel preto com faróis baixos, cortava vagarosamente o vento, parecia estar escolhendo algum ponto para estacionar e na altura da quinta palmeira parou silenciosamente, a porta foi aberta e uma mulher jovem, pele morena clara, cabelos longos, um pouco magra e estatura mediana desceu, estava vestida com um vestido preto, não muito apertado, até um pouco acima do joelho, deixando um pouco das pernas à mostra, com uma rosa vermelha na mão, fechou a porta do automóvel com as chaves dentro e vidros fechados, caminhou lentamente para a praia, estava descalça e foi brincando de levantar a areia, olhou a lua, mandou um beijo, acenou um adeus para um barco que navegava lá no horizonte. A rosa estava em suas mãos e tinha os espinhos, ela levou-a até a altura do peito e esfregou os espinhos levemente por cima do vestido preto não muito apertado, os espinhos rasgaram o vestido e seu corpo e uma pequena mancha de sangue tocou o vestido preto, seus seios estavam arrepiados pela friagem, pelo toque do vento que vem do mar, seus mamilos pareciam querer furar o frágil tecido preto do vestido preto não muito apertado, ela chegou até a beira mar e caminhou sentido a água verde noturna do mar, virou de frente pro mar, sendo iluminada pela lua, cabelos ao vento, olhar distante e um sorriso nos lábios, esquecendo o lamento. Seus lábios não tinham marcas de batom, nenhuma maquiagem no rosto, abaixou-se e colocou a rosa na água verde noturna do mar, empurrou-a com os dedos, depois levantou-se, olhou o peito manchado de sangue e nem mesmo se importou, apenas olhou. Tem apenas um mar à sua frente, um mar na noite, logo ali onde termina os passos na areia,logo depois da ponta dos ventos que balançam seus cabelos. Despiu seu vestido preto não muito apertado e agora tem apenas um mar de águas verdes na noite, depois de despir o corpo nu de tanta espera, depois que a noite abrandou o leito, depois que a solidão se aqueceu na brisa, para invadir sua alma despida, sentida, quase sem vida, tem apenas uma solidão no mar vestido de preto, tem apenas esse mar que morrerá na noite vestido de preto e não há outro jeito. Olhou o mar, um olhar de leve e ficou sem jeito e então seguiu rumo ao fundo do mar de águas verdes, devagar, o mar foi engolido-a aos poucos, como se estivessem fazendo amor, bem devagar, até que ela, nua, ávida de amor, de dor sem seu vestido quase preto, foi em busca dos seus sonhos e desapareceu na noite, no fundo do seu mar, deixando apenas o automóvel preto, trancado com as chaves dentro na beira da estrada e o vestígio da solidão que não deu em nada.